4.12.2010

Nobody loves me

Nobody loves me
It's true

Só depois de ouvir meio distraído muitas vezes, reparei no terceiro verso da canção:
Not like you do

Ela canta esse verso um pouco mais para dentro, mais abafado, do que o início do refrão. A voz de Beth Gibbons é melancólica, o trip hop da banda é introspectivo, o nome da música é Sour Times - "tempos amargos". Este "not like you do" me deixa com uma ponta de dúvida. Ninguém me ama "como você" ou "não (é verdade) que você me ame"? Ela fala em disfarces, clama por sinceridade, e aponta que as "circunstâncias vão decidir".

A canção do Portishead tem ido e voltado na minha cabeça diante da consideração de que ninguém me ama. Acho que nunca antes, em quase trinta anos de vida, despertei tanta admiração - mas amor? Há muito tempo que ninguém me permite uma única chance para o amor. As mulheres têm se relacionado comigo com todas as precauções imagináveis, abandonando-me ao menor sinal de que um sentimento mais forte possa surgir.

Se eu for otimista, posso entender o segredo sussurrante do "not like you do" como um "ninguém me ama como você". Mas não mudaria a atmosfera da música - continuaria melancólica, com vidas enterradas e memórias de ontem.

Já não consigo mais dizer se o problema é meu ou delas. Estou pensando em amor, mas, assim como Beth Gibbons, desconfio de todos seus maneirismos mais codificados. Cavalheirismo, juras precipitadas, dez telefonemas por dia - na minha opinião, convenções sociais e neurose são um pouco diferentes de amor. A maioria das pessoas prefere assim mesmo, acho até que se sentem mais confortáveis com o mero simulacro do que com uma conexão verdadeira. Principalmente quem não se conhece muito bem, não permite uma relação onde os dois tentem se aproximar um do outro. Nada contra flores, mas qualquer mulher experiente deveria saber que os pseudo-cavalheiros as usam como disfarce. Mais ou menos assim: "Fique olhando para essas flores, mas não olhe por trás dos meus olhos, ok?". A ironia é que o acordo é aceito com um certo alívio; se a mulher apenas superficialmente quer conhecer seu homem, mas morre de medo do que pode encontrar no fundo, prefere o vermelho das flores do que o de seu coração pulsante.

Elogios à roupa, perguntas sobre como foi seu dia, presentinhos, bilhetinhos, um milhão de telefonemas - claro que em muitos casos isso pode conter um carinho sincero, mas em inúmeros outros, se reduz a apenas técnica, manutenção, procedimentos burocráticos que os homens, ao longo de gerações, aprenderam ser necessários para que a parceria funcione, independemente do que estejam sentindo. Ou apenas neurose, onde não se enxerga o outro, apenas se controla os papéis em cena. Não estou propondo o fechamento de todas as floriculturas - ora, eu já dei flores de presente - apenas que o foco esteja no que não é decorativo. Na minha opinião, o amor é a exceção da exceção. A cada dez casais que pensam que se amam, talvez apenas um se relacione com alguma verdade. A maioria das pessoas simplesmente não tem estômago para aceitar o parceiro tal como ele é, pelo motivo óbvio de que não aceitam a si mesmas tal como são.

A simples encenação de um namoro ou de um casamento pode parecer sublime, mas eu prefiro não confundir a personagem com a atriz. O momento de sedução sempre é um teatro, inevitavelmente, e eu até subo no palco e recito algumas falas decoradas. Mas quando ameaço tirar a maquiagem para que alguma coisa real tome lugar, geralmente é o início do fim. Elas nem mesmo esperam para ver se meu rosto ao natural lhes agrada ou não - é o próprio gesto de tirar a máscara que as assusta. Talvez porque se sentiriam impelidas a limpar o rosto delas também. Ao menos, esta é a minha versão do que tem me acontecido com uma irritante recorrência.

Mas quem sou eu para falar de amor? Afinal, nobody loves me
It's true

5 comments:

Ivan Hegen said...

escrevi isso 4:15 da manhã, num dia puto. talvez um dia me arrependa de publicar esse post, mas estava difícil guardar todos esses pensamentos só para mim.

Anonymous said...

Love is tricky, my friend

I guess nobody loves me either

Ivan Hegen said...

Fucking tricky, man

Eu só queria um amor que não fosse uma farsa. Estou sendo utópico?

Francieli said...

Está.

Priscila Moreno said...

Coitadinho! Faz tempo já, mas... Coitadinho!