4.29.2010

Crise dos 30

Este blog, com este nome, não vai sobreviver à minha crise dos 30. Que completo no dia 14 de julho. Data revolucionária, dia da Queda da Bastilha, o que sempre me deu um certo orgulho e um ímpeto por mudanças repentinas. Especialmente dos vinte até hoje, mal consegui atravessar dois meses sem enfrentar questionamentos bruscos de alguma ordem, fosse política, estética, afetiva, psicológica ou metafísica. É exaustivo, afinal dificilmente alguém consegue me acompanhar em tantas guinadas. Este blog mesmo... mal sei como tem sua média de 12 visitas por dia. Também nem desconfio como mantenho algumas amizades por 15 anos, se não sou a mesma pessoa por mais do que alguns instantes. Claro, eu só sobrevivo por ter esses parceiros de longa data,  mas sinto que só uma companhia me tem sido realmente constante: o espírito questionador, que em muitas situações mais me atrapalha do que ajuda.

No entanto, se você traça linhas aleatórias por muito tempo, algumas começam a incidir com maior visibilidade do que outras. O desenho vai se tornando mais visível, certos caminhos se sobressaem. Após muitas reviravoltas, por exemplo, é com alívio que chego a um momento profissional satisfatório. Estou adorando fazer traduções para a Discovery Channel, acho que descobri um nicho onde sou competente profissionalmente. Meu inglês ainda não é impecável, mas tem alguma coisa nessa rotina multitask que vai ao encontro da minha personalidade: o trabalho com a língua; a atenção à imagem; bocas abrindo e fechando onde encaixar a dublagem; o aprendizado a cada documentário; e o próprio ritmo frenético de passar de uma janela para a outra me são viciantes. Além das traduções, tenho lecionado inglês, o que para mim é um desafio bem maior, mas também recompensador. Acima de tudo, essas aulas têm me deixado mais aberto a pessoas bem diferentes de mim. Com isso, venho flexibilizando meu ponto mais intransigente, mais "jacobino": eu costumava pensar que só tinha a aprender com quem mostrasse algo de espírito-livre. Posso estar ficando velho, mas levei três décadas para entender que a vida não é uma superação atrás da outra. É que meus pais não me ensinaram a ser gente, apenas a ser filósofo ou artista. E por melhor que você seja nessas áreas, é pouco; eu estava deixando de captar muitas frequências e agora eu quero captá-las.

A maldição de ser artista, ao menos um com a imodesta intenção de criar algo relevante, é que quanto menos concessões fizer, mais longe chegará. Não no sentido comercial, claro, isso tem sido inversamente proporcional, mas quanto à contundência. Concessão não é apenas o que você cede para o mercado, pode ser como você se adapta a qualquer nicho estabelecido. Muitos conseguem repoduzir, por exemplo, exatamente o que a Folha de São Paulo ou a USP esperam de um artista, moldando-se àquele formato, independentemente de concordarem ou não. Nem essa facilidade eu me permito, apesar de que, se eu quisesse, saberia como fazê-lo.

Não acho que tenho uma natureza intrinsicamente beligerante, só não consigo ficar quieto quando enxergo erros hediondos que poucos percebem.  Foi com Nietzsche que aprendi o quanto a moral é inimiga da vida, mas quantos têm, mais do que inteligência, estômago para realmente absorver suas lições, 130 anos depois? Harold Rosenberg viu com muita clareza a farsa de grande parte da arte contemporânea, mas essa farsa não é percebida por quase ninguém com lucidez o bastante para contestá-la. O comunismo é uma ideia que chegou a me atrair, mas é impossível observar o homem em suas minúcias e julgá-lo capaz de sair da teoria à prática - mas quantos se dispõem a ver o homem com imparcialidade, sem véus confortadores? E, por fim, o amor, que não está em moda entre intelectuais, mas é sempre um filão para grande público. O pior é que eu acredito no amor, mas não como o vendem. A cada experiência que atravesso, repito a pergunta com maior decepção: cadê a coragem das pessoas para se abrirem ao outro sem se apoiar em um monte de mentiras?


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